domingo, 15 de janeiro de 2017

O casamento é mesmo uma via de mão dupla.

Há tempos escuto pessoas falando que "larguei tudo" e que "desisti dos meus sonhos" pra "seguir" meu marido. Coloco as expressões entre aspas porque não são minhas e eu sinceramente não sei se as diria.

A verdade é que sim, eu deixei de investir em muita coisa bacana pra minha carreira e pro meu estilo de vida no Brasil (o que já foi doloroso, não é mais) para investir na oportunidade maravilhosa que o marido recebeu de vir pros Estados Unidos continuar os estudos. Mas veja bem, não é como se o sonho dourado fosse vir pros EUA porque nunca foi o meu sonho e nunca foi o dele também, já que sempre preferimos os países europeus, africanos ou asiáticos (nessa ordem), mas foi aqui que a porta se abriu e foi aqui que tudo se encaixou pra esse crescimento - intelectual e emocional, sem dúvida muito emocional.

Quando um casal casa acontece de tomarmos decisões que influenciem diretamente a vida dos dois, sem contudo deixar um lado desfavorecido, foi assim que viemos parar aqui. Na mesma época eu estudava a possibilidade de ir pro Chile estudar mais técnicas de Naturoterapia e investir em melhor qualidade de vida também, mas no Chile o maridão não teria como prosseguir com os estudos porque a situação do Chile pra energias renováveis é bem parecida com a do Brasil e daí seria muito muito bom pra mim e em se tratando de emprego/estudo seria de meia boca a ruim pro dito cujo. Surgiu então a oportunidade de irmos para um dos emirados dos Emirados Árabes Unidos e por mais que a ideia me interessasse muito - cara, eu queria demaaaais isso - eu não poderia trabalhar ou estudar naquele emirado e teria pouco contato com o habib também, porque lá o buraco é mais embaixo até pras esposas. Aí surgiu a chance de vir pros EUA e aqui eu poderia trabalhar e estudar (estudar é na teoria, tá? Acesso à educação aqui é um absurdo de caro e acho que só vou conseguir pagar por ela daqui uns bons 10 anos, quando eu já estiver morando em outro país... ahaahaha) enquanto o maridão fazia o PhD.

Mas nem tudo são flores na vida de Joseph Climber.

Eu nunca me interessei por aprender inglês porque sempre achei a língua feia (ainda acho) e até desnecessária (não acho mais), porque eu me viro bem em francês e espanhol. Porém, "em Roma, como os Romanos!", me esforcei muito pra aprender o idioma local e - não sem muito choro e frustração e cartazes pela casa sinalizando diferença entre verbos -  hoje estou num nível praticamente fluente, o que me garantiu emprego e maior nível de satisfação, porque é infernal pensar por 15 minutos antes de entrar num restaurante se você vai conseguir fazer o pedido.

E é aqui que a gente volta a falar sobre o casamento, essa via de mão dupla.

Só o Maridíssimo sabe o quanto eu chorei, gritei, quebrei coisas, me encolhi na cama, não quis sair de casa, quis sair de casa, fiquei frustrada, fiquei feliz, me superei, regredi e cortei todo o dobrado do mundo pra conseguir sair do casulo. Enquanto muita gente acha que eu vim pra apoiá-lo, praticamente ninguém tem ideia do quanto ele me apoia diariamente. Bilhetes, fotos e outras fofurinhas são ótimas e ajudam nos dias tristinhos, mas quando você se sente um pedaço de bosta deslocado e podre, o que você precisa mesmo é alguém que acredite em você de corpo e alma, sem duvidar nem por um segundo que isso tudo vai passar e você vai voltar a mostrar o seu melhor. Eu tive isso. Eu tenho isso.

Hoje estávamos conversando e ele disse "amor, quantas entrevistas de emprego você fez?" eu disse que havia feito duas, aí ele completou "viu só? E nas duas você conseguiu o emprego! Eu sabia que se dessem a chance de conversar frente a frente você conseguiria!". Eu dei risada e brinquei sobre estar com 100% de aproveitamento, mas na verdade sei que por mais pé na porta e guerreira que eu seja, o apoio dele foi - e é - fundamental pra que eu me sinta cada dia mais segura nesse país tão desassossegado, tão volúvel. A paciência com a qual ele esperou que eu me sentisse segura para fazer o pedido do meu lanche, para procurar emprego na internet, para ter coragem de ligar pra um número de telefone para resolver um problema, para dirigir sozinha, eu nem tenho como descrever porque eu nunca antes tinha tido contato com alguém tão paciente comigo. Nem pai, nem mãe, nem namoradxs anteriores, ninguém tinha entendido ainda que por mais agitada e 'resolvedora' de problemas que eu seja, eu também tenho medo, também fico com vergonha, também fico sem saber como agir e o marido entendeu isso tudo e me deu tempo e espaço para que eu me 're-conhecesse' e entendesse o novo ambiente e criasse novas asas (ainda pequenas, vá lá) para poder passarinhar por esse novo espaço e estilo de vida.

Se eu vim dar apoio a ele, ele também veio me dar apoio, assim nós saímos (eu pela segunda vez, ele pela primeira) do berço tão cômodo e quentinho em que estávamos, para que juntos pudéssemos fazer a coisa mais dolorosa e mais prazerosa do mundo: Crescer.

Fonte do Bellagio e vista do Hotel Paris, Las Vegas,2016

quinta-feira, 14 de julho de 2016

O Enforcado.

Ah, poesia que só vem quando a vontade de morrer vem junto.

Megera.

Costumava andar comigo toda prosa, toda rima, toda inteira.

Agora nem me vê, só vem pra me rir.
Pra zombar da minha falta de jeito, da falta de rumo, de prumo, de viço, de sexo, de orientação, de compasso.

Ah, poesia... Você já foi mais minha amiga.
Já me acalentou mais, me amou mais, me viveu mais.
Poesia a senhora já me foi mais flor, mais amor, mais verso de laranjeira.

Hoje só vem quando sabe que não tô inteira.

Achei que já tivéssemos feito as pazes, mas qual paz é a paz do poeta?

Nem paz nem paciência.

A Dona Poesia só me traz vísceras e órgãos.

Ela me troca em miúdos.


terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Como nascem as pessoas geniais?

- Você já percebeu que confunde tudo?

- É, já percebi sim.

- Então por que não presta mais atenção?

- Eu presto atenção. Mesmo.  Mas continuo confusa. Acho que é porque eu presto atenção, aí as coisas ficam maiores. Bem maiores. Entende o que eu quero dizer?

- Não. Não faz sentido.

- Faz sim. É como se quando eu visse uma banana eu prestasse tanta atenção nela que ela virasse um cacho de bananas. Aí ela fica grande demais, ela fica maior, ela vira um cacho, uma bananeira, uma floresta.

- Então preste atenção só na banana.

- Você já percebeu que não entende nada?

- Quê?

- Você já percebeu que não entende nada?

- Mas... Isso não faz sentido nenhum. Você que não consegue se concentrar em uma coisa só e eu que não entendo nada?

- É, você realmente não entende nada. Quando eu confundo as coisas não é porque eu não estava prestando atenção nelas, é porque eu prestei atenção demais e elas se multiplicaram, cresceram, ganharam vida própria. Se eu não tivesse prestado tanta atenção talvez a banana fosse mesmo só uma banana e isso fosse mais fácil de explicar.

- Para de confundir tudo!

- Acho que é isso. Eu não estou confundindo tudo. Muito pelo contrário! Estou explicando tudo, vocês não entendem minhas explicações e eu fico como confusa. Talvez o seu olhar seja raso demais.

- Então você é genial e nós somos burros?

- Não. Ninguém é burro. Essa expressão é só pra minar a confiança de quem chega a respostas diferentes. Genial é quem foi chamado de burro a vida toda, até conseguir provar que sua resposta diferente estava certa.

- Tá, então você é genial, mesmo que nós não sejamos burros?

- Não. Eu não consegui provar nada até agora. Talvez eu nunca consiga, inclusive. Então eu sou só na média mesmo.

- Se você é na média, isso prova que você confunde tudo. Então pare de confundir tudo.


- Agora que eu entendi que eu passo mais tempo explicando que confundindo já posso dizer que eu não confundo nada. Talvez eu tenha a profundidade de um oceano, ou da fome de um gigante, daí tenho mais coisas pra pensar, ver, sentir e misturar. Mas confundir não. Agora que eu entendi, já não confundo mais nada.

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Lixo que não é lixo não vai pro lixo.

Quando estávamos em Curitiba, o loiro vivia procurando móveis para comprar assim que chegássemos em Irvine, mas eu estava vivendo tão intensamente cada momento da mudança que me permiti só me preocupar quando chegássemos aqui.

No dia em que chegamos, gastamos um bom dinheiro na Ikea, como eu já contei e daí quando chegamos em casa, nos ensinaram a... Olhar os lixos.

Isso mesmo, os lixos.

Fomos no walmart gastar 100,00 dólares com coisas para a casa, tipo jogo da panelas (que já perderam o ‘antiaderente’), talheres, toalhas e afins, e na volta passamos por um apartamento onde um sofá de couro vermelho estava na calçada. Tinha um chinês entrando no apartamento, perguntamos se era dele e ele disse q sim, então estávamos indo embora quando percebi 4 cadeiras altas, dessas de usar nos passa-prato (bancada, bancada americana) em boa condição, perto do lixo. Foi uma festa! Pegamos 3 delas que estão com a gente e vão permanecer por um looooongo tempo.

A partir daí virou bagunça: luminária veio do lixo, jogo de pratos (novos, com embalagem!), maquiagem (3 estojos novinhos, sem nenhuma marca de uso!), mesa de centro, quadro de recados, panela, cadeira para escrivaninha, (3)lixeiras, cesto de roupa suja, banqueta de penteadeira (daquelas mais baixas e largas), copos, canecas, armário pra livros, objetos de decoração... Não sei mais quantas coisas, mas deve ter mais...

Hoje eu fui levar o lixo e dei aquela olhadinha básica na lavanderia (tem um espaço nas lavanderias do housing para doações), encontrei 3 lençóis em excelentes condições e super cheirosos tbm, lógico q trouxe para casa! Sim, vou lavar novamente antes de usar, mas poxa, a gente só comprou um jogo de lençol aqui porque foi o que o dinheiro deu, agora conseguimos mais 3 lençóis! Muito amor!

Quanto aos nossos sofás, pagamos super caro em um (30,00 dólares) e um preço ok no outro (10,00 dólares). MAS RÔ A SENHORA ESTÁ LOUCA TRINTA CONTO É MEGA BARATO. Aí eu te digo: sofá tem pelo menos uma vez na semana em algum dos lixos do housing... A maioria são bons sofás, mas tem uma galera que deixa os sofás sem as almofadas e eu fico realmente confusa do motivo que levaria alguém a ficar apenas com as almofadas em casa.

Uma vizinha levou a gente no bazar da Marines Church, e o preço básico de lá é 2 dólares. Foi lá que compramos o sofá por 10,00, e lá eu fiquei louca com a quantidade de louça bonita que tem. Até agora só comprei 2 taças (1 dólar cada), mas a vontade é me acabar nas travessas e louças de época... Além de louças e móveis, nesse bazar tem eletros, roupas (todas as idades e tamanhos e estilos), calçados e livros. É super bacana e uma excelente saída pra quem, assim como eu, está na Califórnia e – ainda – não é rica. Inclusive, lá também tem muita coisa pra doação, muita mesmo! Uma amiga pegou grátis uma sapateira e vários quadros!

Pensei em colocar fotos dos móveis, mas decidi colocar só a minha foto saindo do lixo da Marines, quando peguei as caixas de rolo de filme mais legais do mundo, que estão servindo de porta-lápis e de porta-trecos aqui em casa.


P.s.: Deu pra entender porquê existem tantos acumuladores nos EUA? Comprar é muito acessível, achar coisas novas no lixo é muito fácil e se você for uma pessoa apegada demais, simplesmente vai socando a casa, aí quando percebe está no meio de um vazio existencial e de uma grande bagunça. 

 
(não resisti, as cadeiras são lindas demais)