quarta-feira, 9 de setembro de 2015

O cheiro de Irvine, ou sobre como tamanduás de roupinhas são fofos.

Chegar numa cidade nova pode ser encantador ou broxante.

Chegar em Irvine foi como chegar na casa da avó da gente, quando a gente gosta da avó. Irvine cheira bem e o ar era fresco, mesmo com o calor de uns 25 graus que estava fazendo.

Eram duas da tarde aqui, portanto, seis da tarde no Brasil. Tudo o que meu corpo queria descansar. Comer algo quente, tomar um bom banho, deitar. Porém... Eram duas da tarde aqui, o sol estava a pino, a gente estava com um carro alugado e precisava aproveitar pra comprar as coisas pra mobiliar nosso apartamento, que ficaria disponível dali dois dias. Por mais que o corpo pedisse pra descansar, eu ainda estava mentalmente bem atenta, porque por mais que eu não acreditasse nisso, o corpo dá uma bugada feroz com a mudança de fuso, de pressão do ar, de altitude... Quando sentei dentro do apartamento da moça que nos recebeu, comecei a marear, exatamente igual quando a gente vai pra alto mar e fica duas, três horas navegando. Deu tontura, enjoo, mal estar. Todo o labirinto que havia levado horas pra acostumar a ficar ‘trimilicando’ levaria dois dias inteiros pra se acostumar com estar em terra firme novamente.

Levei uns dez minutos pra conseguir usar o banheiro, lavar o rosto e trocar de roupa, porque ao contrário de Curitiba ameaçava esfriar e me obrigou a viajar de calça e bota, em Irvine o sol estava firme e o céu super azul. Minissaia porque era o que estava na mala de mão, chinelo porque era o que cabia no pé e bola pra frente. Entramos no carro e como bons brasileiros fomos comer comida chinesa servida por uma japonesa num complexo de restaurantes americanos. Yakissoba mais apimentado que provei na vida, suco mais doce que bebi na vida, mas pelo menos deu energia pra seguir pra um lugar bem curioso, chamado Ikea.

A Ikea é uma mistura de Casas Bahia com Casa China, encontramos canecas de porcelana por 49 centavos, e jogo de quarto por setecentos dólares. Uma pechincha. Li um texto hoje que diz que o melhor lugar do mundo pra ser classe média é o Brasil, e isso é verdade. Na Ikea você paga uma taxa de uns cem dólares se quiser escolher o produto do showroom, pagar e ir embora. Agora, se você for uma pessoa com uma realidade de mundo mais prática e que dá até nó em pingo d’água pra economizar dinheiro, a loja oferece a seguinte opção: Vá até o térreo, pegue peça por peça dos seus móveis (literalmente) e leve num carrinho enorme até o caixa, depois leve o mesmo carrinho até o local onde os móveis precisam ser despachados, caso necessite de entrega (que foi o nosso caso) e pague outra taxa caso precise que os móveis sejam montados, porque só no Brasil a profissão de montador de móveis é vista como “nossa, tá cobrando tudo isso? Caro demais!!”, aqui se paga – e se paga bem – até pra apertar um parafuso.

Falei que só no Brasil é fácil ser classe média? Então, eu sou estudante aqui, nem tenho classe... aahhahaha Mas se quiser mordomias e gente fazendo coisas pra você, tipo montar móveis ou carregar as chapas do seu próprio guarda-roupas, prepare-se pra desembolsar mais da metade do seu ordenado, porque tudo na mão é só na terra brasilis mesmo. Somos mal acostumados e nem sabemos...

Eu já não me aguentava em pé, o marido que é branco estava com olheiras marrons bem profundas, mas ainda não era hora de dormir, por mais que fosse dez da noite aqui e cerca de duas da manhã no Brasil, e, portanto, horário do nosso relógio biológico.

Aproveitamos pra passar no Walmart pra comprar alguma coisa pra comer pro dia seguinte, e coisas urgentes que não tínhamos, tipo pasta de dente e sabonete. Inclusive, esse tal shampoo da moda, o Aussie, é pouco mais de 6 dólares aqui, exatamente como o Pantene. Ah, não só a embalagem do Shampoo, o kit com o condicionador junto é 6 doláres.

Chegando no apartamento da nossa anfitriã, que mora num prédio de 3 andares sem elevador, porque elevador não precisa, né gente, vamo malhar pernas, pensei numa coisa engraçada: foi o primeiro lugar do mundo em que vesti saia e chinelo de dedo e me senti super bem vestida. Era como se eu tivesse super arrumada, quando só estava muito confortável.

No dia seguinte acordamos realmente cedo e fomos fazer meio zilhão de coisas até entregar o carro, inclusive tomar café da manhã na rua. Café da manhã que fiz questão que fosse bem americano: Torradas, ovos mexidos e o bacon mais crocante que comi na vida, o café em si, porém, muito fraco, não gostei não.

Depois de entregarmos o carro, perto das duas da tarde, fomos pro escritório do “condomínio” resolver papeladas pra pegarmos a chave do ap no dia seguinte. Mesmo com a correria conseguimos olhar um pouco da universidade de Irvine e ela é linda. Tem árvore por tudo, tem gente ‘pelada’ por tudo (se você acha que tua roupa aí é curta, meu irmão...) e tem um dos comportamentos masculinos mais amáveis que vi até agora: nenhuma cantada, nenhuma olhada invasiva, nenhum constrangimento. Ainda não sei se em todo os lugares é assim, ou se é assim o tempo todo, mas provavelmente nunca me senti tão à vontade em usar roupa curta, sem me sentir um pedaço de picanha.

Lá pelas quatro da tarde recebemos uma ligação bem bacana: a nossa mala perdida estava nos esperando à nossa porta. Se eu fiquei preocupada achando que nunca mais veríamos a bagagem? Em nenhum momento. Sempre achei que seria entregue em um ou dois dias, porque a bagagem estava com código de rastreio e em momento algum ficamos sem saber informações dela (acho que a mala só queria passear, ela foi pra Houstoun, pra Austin, pra Los Angeles e daí pra Irvine), então quando pegamos a mala não foi tão eufórico assim, mas foi bom, bem bom.

Depois da mala em mãos restava apenas comer, tomar banho e dormir, e estávamos tão exaustos que às oito da noite já estávamos na cama. As seis e meia da manhã do dia 4 já estávamos de pé, recompostos e felizes. Esperamos o banco abrir pra poder registrar a assinatura (o horário comercial aqui é das 9 às 17:00, quer algo mais genial do que não precisar madrugar e ainda sair do trabalho com tempo de aproveitar o fim do dia?) e aí ficamos esperando dar o horário pra pegarmos a chave do apartamento.

Por que tanta preocupação com o apartamento? O que estamos fazendo aqui? A comida é diferente? A coca tem outro gosto? É barato comer? É barato viver? É o sonho americano morar na Califórnia? Lá na frente eu conto...

Por enquanto, gostaria de dizer que essa coisa de “a cultura é diferente”, “no Brasil não tem cultura”, “isso sim é que é país”, é muita balela. Não funciona assim não, tem milhares de coisas no Brasil que tem qualidade infinitamente superior. O que realmente dá pra sentir de diferença é a educação. Quando fomos ao banco eu estava de tênis, bermuda e camiseta, o maridão de regata e bermuda, ambos com sacolas nas mãos, porque aproveitamos o mercadinho (caro...) que havia perto do banco. Logo pensei que iam fazer pouco caso da gente, porque estávamos mal vestidos... Bobagem! A atendente dentro do seu tailleur curtíssimo com um decote imenso nos atendeu como reis, foi gentil e educada como todos os prestadores de serviço devem ser (não como a moça do Banco do Brasil que me disse: “fiz tudo o que eu pude, você não tem o direito de estar chateada) e isso se estende a todos os atendentes e funcionários públicos que vi até agora. Nos escritórios da faculdade te oferecem café, chá, limonada, frutas e biscoitos só por você ir lá pedir informação.

A cultura não é melhor ou pior, mas a educação é muito diferente. É gentil sem ser invasiva. Gostei bastante.

Estou feliz, experimentando cada primeira experiência exatamente igual uma criança de alguns meses experimenta o mundo.

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