Chegar numa cidade nova pode ser
encantador ou broxante.
Chegar em Irvine foi como chegar
na casa da avó da gente, quando a gente gosta da avó. Irvine cheira bem e o ar
era fresco, mesmo com o calor de uns 25 graus que estava fazendo.
Eram duas da tarde aqui,
portanto, seis da tarde no Brasil. Tudo o que meu corpo queria descansar. Comer
algo quente, tomar um bom banho, deitar. Porém... Eram duas da tarde aqui, o
sol estava a pino, a gente estava com um carro alugado e precisava aproveitar
pra comprar as coisas pra mobiliar nosso apartamento, que ficaria disponível
dali dois dias. Por mais que o corpo pedisse pra descansar, eu ainda estava
mentalmente bem atenta, porque por mais que eu não acreditasse nisso, o corpo
dá uma bugada feroz com a mudança de fuso, de pressão do ar, de altitude...
Quando sentei dentro do apartamento da moça que nos recebeu, comecei a marear,
exatamente igual quando a gente vai pra alto mar e fica duas, três horas
navegando. Deu tontura, enjoo, mal estar. Todo o labirinto que havia levado
horas pra acostumar a ficar ‘trimilicando’ levaria dois dias inteiros pra se
acostumar com estar em terra firme novamente.
Levei uns dez minutos pra
conseguir usar o banheiro, lavar o rosto e trocar de roupa, porque ao contrário
de Curitiba ameaçava esfriar e me obrigou a viajar de calça e bota, em Irvine o
sol estava firme e o céu super azul. Minissaia porque era o que estava na mala
de mão, chinelo porque era o que cabia no pé e bola pra frente. Entramos no
carro e como bons brasileiros fomos comer comida chinesa servida por uma
japonesa num complexo de restaurantes americanos. Yakissoba mais apimentado que
provei na vida, suco mais doce que bebi na vida, mas pelo menos deu energia pra
seguir pra um lugar bem curioso, chamado Ikea.
A Ikea é uma mistura de Casas
Bahia com Casa China, encontramos canecas de porcelana por 49 centavos, e jogo
de quarto por setecentos dólares. Uma pechincha. Li um texto hoje que diz que o
melhor lugar do mundo pra ser classe média é o Brasil, e isso é verdade. Na
Ikea você paga uma taxa de uns cem dólares se quiser escolher o produto do
showroom, pagar e ir embora. Agora, se você for uma pessoa com uma realidade de
mundo mais prática e que dá até nó em pingo d’água pra economizar dinheiro, a
loja oferece a seguinte opção: Vá até o térreo, pegue peça por peça dos seus
móveis (literalmente) e leve num carrinho enorme até o caixa, depois leve o
mesmo carrinho até o local onde os móveis precisam ser despachados, caso
necessite de entrega (que foi o nosso caso) e pague outra taxa caso precise que
os móveis sejam montados, porque só no Brasil a profissão de montador de móveis
é vista como “nossa, tá cobrando tudo isso? Caro demais!!”, aqui se paga – e se
paga bem – até pra apertar um parafuso.
Falei que só no Brasil é fácil
ser classe média? Então, eu sou estudante aqui, nem tenho classe... aahhahaha
Mas se quiser mordomias e gente fazendo coisas pra você, tipo montar móveis ou
carregar as chapas do seu próprio guarda-roupas, prepare-se pra desembolsar mais
da metade do seu ordenado, porque tudo na mão é só na terra brasilis mesmo.
Somos mal acostumados e nem sabemos...
Eu já não me aguentava em pé, o
marido que é branco estava com olheiras marrons bem profundas, mas ainda não
era hora de dormir, por mais que fosse dez da noite aqui e cerca de duas da
manhã no Brasil, e, portanto, horário do nosso relógio biológico.
Aproveitamos pra passar no
Walmart pra comprar alguma coisa pra comer pro dia seguinte, e coisas urgentes
que não tínhamos, tipo pasta de dente e sabonete. Inclusive, esse tal shampoo
da moda, o Aussie, é pouco mais de 6 dólares aqui, exatamente como o Pantene.
Ah, não só a embalagem do Shampoo, o kit com o condicionador junto é 6 doláres.
Chegando no apartamento da nossa
anfitriã, que mora num prédio de 3 andares sem elevador, porque elevador não
precisa, né gente, vamo malhar pernas, pensei numa coisa engraçada: foi o
primeiro lugar do mundo em que vesti saia e chinelo de dedo e me senti super
bem vestida. Era como se eu tivesse super arrumada, quando só estava muito
confortável.
No dia seguinte acordamos realmente
cedo e fomos fazer meio zilhão de coisas até entregar o carro, inclusive tomar
café da manhã na rua. Café da manhã que fiz questão que fosse bem americano:
Torradas, ovos mexidos e o bacon mais crocante que comi na vida, o café em si,
porém, muito fraco, não gostei não.
Depois de entregarmos o carro,
perto das duas da tarde, fomos pro escritório do “condomínio” resolver
papeladas pra pegarmos a chave do ap no dia seguinte. Mesmo com a correria
conseguimos olhar um pouco da universidade de Irvine e ela é linda. Tem árvore
por tudo, tem gente ‘pelada’ por tudo (se você acha que tua roupa aí é curta,
meu irmão...) e tem um dos comportamentos masculinos mais amáveis que vi até
agora: nenhuma cantada, nenhuma olhada invasiva, nenhum constrangimento. Ainda
não sei se em todo os lugares é assim, ou se é assim o tempo todo, mas
provavelmente nunca me senti tão à vontade em usar roupa curta, sem me sentir
um pedaço de picanha.
Lá pelas quatro da tarde recebemos
uma ligação bem bacana: a nossa mala perdida estava nos esperando à nossa
porta. Se eu fiquei preocupada achando que nunca mais veríamos a bagagem? Em
nenhum momento. Sempre achei que seria entregue em um ou dois dias, porque a
bagagem estava com código de rastreio e em momento algum ficamos sem saber
informações dela (acho que a mala só queria passear, ela foi pra Houstoun, pra Austin,
pra Los Angeles e daí pra Irvine), então quando pegamos a mala não foi tão
eufórico assim, mas foi bom, bem bom.
Depois da mala em mãos restava
apenas comer, tomar banho e dormir, e estávamos tão exaustos que às oito da
noite já estávamos na cama. As seis e meia da manhã do dia 4 já estávamos de
pé, recompostos e felizes. Esperamos o banco abrir pra poder registrar a
assinatura (o horário comercial aqui é das 9 às 17:00, quer algo mais genial do
que não precisar madrugar e ainda sair do trabalho com tempo de aproveitar o
fim do dia?) e aí ficamos esperando dar o horário pra pegarmos a chave do
apartamento.
Por que tanta preocupação com o
apartamento? O que estamos fazendo aqui? A comida é diferente? A coca tem outro
gosto? É barato comer? É barato viver? É o sonho americano morar na Califórnia?
Lá na frente eu conto...
Por enquanto, gostaria de dizer
que essa coisa de “a cultura é diferente”, “no Brasil não tem cultura”, “isso
sim é que é país”, é muita balela. Não funciona assim não, tem milhares de
coisas no Brasil que tem qualidade infinitamente superior. O que realmente dá
pra sentir de diferença é a educação. Quando fomos ao banco eu estava de tênis,
bermuda e camiseta, o maridão de regata e bermuda, ambos com sacolas nas mãos,
porque aproveitamos o mercadinho (caro...) que havia perto do banco. Logo
pensei que iam fazer pouco caso da gente, porque estávamos mal vestidos...
Bobagem! A atendente dentro do seu tailleur curtíssimo com um decote imenso nos
atendeu como reis, foi gentil e educada como todos os prestadores de serviço
devem ser (não como a moça do Banco do Brasil que me disse: “fiz tudo o que eu
pude, você não tem o direito de estar chateada) e isso se estende a todos os
atendentes e funcionários públicos que vi até agora. Nos escritórios da
faculdade te oferecem café, chá, limonada, frutas e biscoitos só por você ir lá
pedir informação.
A cultura não é melhor ou pior,
mas a educação é muito diferente. É gentil sem ser invasiva. Gostei bastante.
Estou feliz, experimentando cada
primeira experiência exatamente igual uma criança de alguns meses experimenta o
mundo.
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