Não que eu quisesse estar
escrevendo agora, com os fones de ouvido desligados e essa vontade de dormir,
mas pelo visto a vontade de contar causo é maior que tudo.
Naquele dia eu fui voar de avião
pela primeira vez. Voar de avião? Andar de avião? Não sei bem como dizer, mas o
fato é que eu nunca tinha entrado num avião antes. Malmente tinha ido num
aeroporto.
A crise de riso foi algo quase
imprescindível, como quando alguém me conta algo ruim, ou como quando eu fico
com muita vergonha ou ansiedade. Ri até chorar. O avião subindo e eu rindo e
rindo e as lágrimas escorrendo e eu apertando a mão do meu namorado e rindo e
chorando e rindo e chorando e falando como aquilo era surreal e maravilhoso, e
era mesmo. Realmente era. Ver a cidade ficando pequenininha e as nuvens ficando
cada vez mais brancas é uma coisa tão surpreendente que tira o ar; tira o ar e
te coloca no eixo. O voo foi rápido, ou melhor, os quarenta minutos mais
rápidos da minha vida. Nem tinha acostumado com estar fora do chão e já me
achava apertando o braço da poltrona porque a decida se aproximava: mais choro.
Ainda assim, ver a cidade cada vez maior, mais nítida, mais perto, é muito mais
bonito do que ver a cidade ficando longe. A aterrizagem foi boa e tranquila, e
logo eu estava em São Paulo, naquele mundaréu de gente e de barulhos, num
aeroporto imenso.
Primeira chateação foi a de
esperar a companhia abrir as portas, o que seria quase duas horas depois de
quando chegamos, depois disso veio o primeiro soco no estômago: voo cancelado.
Como assim foi cancelado? O que houve? O que vai acontecer agora? Mais vários
minutos e conseguimos ser realocados em aeronave de outra companhia. Só que
invés do horário inicial previsto, o outro voo sairia duas horas ainda mais
tarde: 6 horas de aeroporto. Não bastasse isso, a aeronave atrasou em quase uma
hora. Ganhamos bolachinhas e snacks da companhia aérea, mas eu queria mesmo era
ir logo. Deu medo quando soube que a aeronave anterior tinha sido ‘bloqueada’
por problemas na manutenção, aí já fiquei cheia de minhoca na cabeça. Minhocas
que morreram absurdamente rápido com o filme e o jantar do avião. Macarrão com
queijo, salada e vinho. Chique, né? Tinha bombom de sobremesa. Comi metade
disso e dormi por umas 4 horas, o que foi bom, já que o voo era de 9 horas...
Quando acordei e pude ver o sol nascendo entre as nuvens fiquei besta, besta
mesmo. Eu estava ao lado do sol, sabe como? Aqueles raios alaranjados, aquele
brilho azul e o branco cintilante... Recomendo que você tenha essa experiência
um dia.
Chegando em solo estadunidense
tive o primeiro choque cultural: a quantidade de negros trabalhando no
aeroporto é maior do que a quantidade de negros que eu via em um dia caminhando
por Curitiba. Achei ótimo ver isso. Negros exercendo cargos que não são os que
comumente vemos no Brasil, como empregados de limpeza ou garçons. No aeroporto
eles eram a maioria e eu amei.
A voz das pessoas foi o meu
segundo choque cultural. Todas as pessoas que ouvi tinham a voz bastante grave
e pareciam todos atores e atrizes de seriado. Tudo ficou meio caricato pra mim,
principalmente quando apareceu o agente da alfândega que era mexicano, com a
cabeça raspada, um corpo escultural e um bigode com cavanhaque: ele parecia
personagem do Miami Vice. Vai ver era. Vai ver eu estava numa pegadinha, sei
lá.
O agente da alfândega foi cortês
e gentil, e não entendi porque todos falam que é ruim passar na alfândega, já que
o procedimento é simples e completamente explicável. Inclusive, lembre-se
sempre de ir com sapato fácil de tirar e com o notebook/tablet/celular em
lugares também fáceis, porque eles precisam passar pelo raio-x.
Liberados da alfândega restava
despachar novamente a bagagem (que pegamos pra poder passar na alfândega...) e
ir pro portão de embarque, mas não sem antes escovar os dentes e lavar o rosto,
que já estava com a maquiagem gasta e com aparência de cansaço extremo. Apenas
uma hora de conexão e veio o terceiro tiro no pé: fuso horário. Pegaríamos o
voo as onze da manhã, com previsão de chegada ao meio dia e meia. Ok, ótimo. Eu
só não contava que estava em Atlanta e que isso é literalmente do outro lado do
país com relação à Califórnia. Mas afinal, o que isso significava? Significava
que o voo seria de quatro horas, e não de uma hora. Onze da manhã em Atlanta é
sete da manhã na Califórnia e o horário marcado no cartão de embarque era
previsão para a chegada em San Diego, independente do fuso. Ok, bora lá.
Pior dos três voos, não só pelo
cansaço, mas pela turbulência. Quatro horas de voo tremelicando na poltrona.
Enjoo, mal estar, cansaço e musiquinha do Gilberto Gil pra animar. O legal dos
voos grandes é que tem uma tela em cada acento, então todos podem ver o que bem
entenderem. Eu resolvi pintar meu livro de colorir para adultos e recebi
elogios de várias aeromoças, sim, eu sei que é comissária de bordo, mas esse
nome não tem tanto glamour quanto o outro, e isso faz toda a diferença.
Chegando em San Diego restava
buscar as malas e finalmente... Pegar um carro e dirigir até Irvine. Mas, cadê
a quarta mala? Só tem três? E agora? Agora era reclamar com a companhia,
preencher papéis, blábláblá, tomar água no bebedouro e descobrir que a água da
costa oeste é lazarentamente salgada, sair do aeroporto num calor de 100 fahrenheits
e ir até a locadora de automóveis, que tem um ônibus bem bacana que vai do
aeroporto pra locadora em minutos, com a motorista mais gentil que já vi, e por
curiosidade, também negra.
O interessante da locadora de
automóveis é sorrir e acenar quando tentarem te vender seguro até do seu dedinho
do pé: importante em situações de batê-lo na quina. Conseguimos sair de lá sem
contratar nada a mais do que precisávamos e isso foi o máximo. O carro era dos
sonhos: Nissan Pathfinder. Todo enorme, todo automático, todo amor maior, todo
meu deus isso não tem chave isso liga num botão mas não liga se o freio não estiver
acionado isso me deixa confuso pelo amor de deus dirige pra mim opa não dirige
não porque o l h a i s s o e s s a r o d o v i a t e m c i n c o p i s t a s.
Cinco pistas. Largas. Enormes.
Boas. Lisinhas. Um sonho.
Em algumas alturas da rodovia
existe o carpool, que é uma pista exclusiva pra quem dirige com duas ou mais
pessoas no carro. E os motoristas respeitam! Genial isso!! Quem leva carro com
mais gente tem prioridade sim, e isso é ótimo porque estimula as caronas!
Depois de 14 horas dentro de
aviões, 28 horas entre aeroportos e voos e duas horas dirigindo, chegamos na
bela e ensolarada Irvine, nossas primeiras horas na cidade foram incríveis e
agitadas, mas isso é outra história...
Por agora só acho importante
dizer: é interessantíssimo dormir em um continente e acordar em outro.
Recomendo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Falar é que lhe resta, divirta-se!